Histórico
O Projeto Integrado de Pesquisa "A Geografia dos Assentamentos na Área Rural" – Projeto GeografAR – vem, desde 1996, desenvolvendo as suas pesquisas apoiado pelo CNPq tendo como proposta analisar o processo de (re) produção do espaço geográfico no campo baiano, em suas distintas temporalidades, espacialidades e territorialidades.
O esforço que se coloca é o de buscar articular as inúmeras escalas e dimensões analíticas que se evidenciam, possibilitando que as pesquisas desenvolvidas adquiram outro significado na busca da compreensão da totalidade do espaço geográfico, sendo esta entendida a partir de Kosik (1976:34) "como um princípio epistemológico e uma exigência metodológica".
Assim, pensa-se a realidade enquanto totalidade em movimento que adquire concretude pela materialização espacial da prática social, sendo evidenciadas distintas temporalidades, espacialidades e territorialidades. Esta compreensão tanto permite o aprofundamento de análises específicas como confluí, obrigatoriamente, para entender seus nexos e suas articulações com outras perspectivas o que define a interdisciplinaridade como eixo na abordagem teórico-metodológica proposta.
A análise geográfica da questão agrária na Bahia realizadas pelo GeografAR iniciou-se com os estudos de caso dos Projetos de Assentamentos em áreas de Reforma Agrária. Estes projetos foram selecionados tendo em vista o momento histórico em que foram implantados e o ordenamento territorial desenvolvido pelo Estado que definiram particularidades em suas organizações socioespaciais (mapa). Assim, foram selecionados:
- Projeto Especial de Colonização Serra do Ramalho (1973) por ter sido o último projeto de colonização realizado no estado da Bahia;
- Projeto de Assentamento Angical (1986) por ter sido o primeiro projeto de assentamento de Reforma Agrária do estado da Bahia, na Nova República;
- Projeto de Assentamento Almas (1987) por ter sido o projeto onde se realizou o primeiro Estudo de Impacto Ambiental e Relatório de Impacto Ambiental (EIA/RIMA) na Bahia;
- Projeto de Assentamento Pé de Serra (1992) por ter sido apontado como o pior projeto na avaliação realizada pela Organização das Nações Unidas para a Agricultura e a Alimentação (FAO);
- Projeto de Assentamento Terra Vista (1995) por ter sido o primeiro projeto em que o reconhecimento da propriedade efetivou-se através do título de concessão real de uso, não tendo sido a área dividida em parcelas individuais.
Contudo, os trabalhos desenvolvidos por seus pesquisadores – através de monografias, dissertações de mestrado, teses de doutorado e de pesquisas específicas –, evidenciaram novas possibilidades de continuidade e aprofundamento da análise espacial do campo baiano. Assim, foi posteriormente incorporado o estudo dos Acampamentos de trabalhadores rurais sem terra e os projetos de assentamento realizados pela política fundiária do Banco Mundial – Programa Cédula da Terra (PCT)/ Programa Crédito Fundiário (PCF). Embora estes assentamentos não se enquadrem como assentamentos de Reforma Agrária são constituídos a partir da pressão dos movimentos sociais que luta pelo acesso a terra.
A emergência de sujeitos sociais que detem a terra, mesmo que de forma precária, e resistem e lutam para sua permanência nela, como as Comunidades de Fundo e Fechos de Pasto, as Comunidades Negras Rurais e Quilombolas e as Comunidades de Pescadores Artesanais foram incorporadas em nossos estudos. Paralelo a estes foi realizado um "Inventário Socioambiental das Barragens na Bahia" que nos aproximou do tema dos atingidos por barragens e de sua principal organização nacional, o Movimentos dos Atingidos por Barragem (MAB). Recentemente, uma nova proposta de estudo se conforma sobre Trabalho Escravo, ou melhor, sobre a precarização das relações sociais do trabalho e as situações análogas ao trabalho escravo no campo baiano.
As reflexões resultantes do acúmulo dos trabalhos de pesquisa até aqui realizados trazem elementos que permitem encontrar os nexos, mas também apontar perspectivas. Neste sentido, tem-se que o que perpassa e articula a questão agrária e os movimentos e grupos sociais, sejam de trabalhadores rurais sem terra, quilombolas, ribeirinhos, indígenas, fundo e fecho de pasto, atingidos por barragem, por parque, por grandes obras de infra-estrutura em sua luta por e na terra é a questão territorial.
Esta compreensão não minimiza ou simplifica a questão específica de cada segmento, mas potencializa a correlação de forças sociais no território. Se ainda falta muito para "entrar" na terra ou para terem sua permanência nela reconhecida, estes grupos sociais vão marcando suas posições políticas, adquirindo visibilidade e apontando perspectivas de mudanças que colocam para todas as áreas do conhecimento o desafio de entendê-las.
Foi enfrentando este desafio que se chegou à temática das Terras Públicas/Terras Devolutas. Aparece como tema recorrente na pauta dos movimentos sociais e de suas organizações de apoio e se apresenta, também, como necessidade de buscar entender os limites estruturais que se colocam para o acessa à terra de uma grande parcela da população numa tentativa de construir os caminhos para a sua superação.
É buscar elementos para refletir sobre seu significado e entender as barreiras estruturais que as protegem de qualquer intervenção, mesmo em situações conjunturais mais favoráveis para que isto aconteça. Uma temática que contribuirá para entender, um pouco mais, o papel do Estado, através de suas políticas de regularização fundiária, dos movimentos sociais e a (re) produção do espaço, eixo analítico do Projeto GeografAR.